Colunistas | A Arte da Desmistura | 23 de julho de 2015 - 18:39

Caburé e gavião

Ivan Wrigg

     De Salgado de São Félix, município do interior da Paraíba, vem essa parábola, contada com sabedoria por Tio Felix, matuto e cantador sertanejo; tio de meu parceiro musical Paulinho Paloce.


     Com seus mais de setenta anos, viveu suas diversas vidas, entre elas, a de cantador e contador de histórias e a de motorneiro de bonde puxado a burros, com sua simplicidade de poucas letras e sua elegância de terno e gravata, nos áureos tempos da sua juventude. Essa é uma das histórias contada para a criançada, nos meados do século passado.


     O caburé é uma avezinha pequenina, franzina. Um gaviãozinho.


     Nas suas andanças, Caburé, num de seus voos, se encontrou com um grande Gavião que é outra ave de rapina.


     Voaram, caçaram e, ao anoitecer, procuraram um galho de uma árvore para descansar e dormir.


     Caburé dormiu a noite toda com um olho fechado, mas o outro aberto.


     De manhãzinha, quando o sol brotou lá no canto do horizonte, depois de ter dado seu voo matinal de bom dia pra natureza, o Gavião chegou perto de Caburé, meio estranho e perguntou:


     - Caburé. Nós somos parceiros, gostamos das mesmas coisas, voamos, caçamos e estivemos juntos o dia inteiro.


    O gaviãozinho ouviu a conversa, de olho esticado pro Gavião, atento a cada palavra. E o gavião continuou.


    - Caburé. Porque você passou a noite toda dormindo com um olho fechado e o outro aberto?


    Sem perder a calma, Caburé respondeu:


    - Quando não se conhece bem as coisas que estão por perto. Quando a noite trás consigo a escuridão e não se sabe se é o amigo certo, a gente precisa dormir com um olho fechado e o outro aberto.